Hospitais de guerra
A escalada da violência no estado, aliado ao fato que criminosos estariam cada vez mais bem armados, inclusive portando armamentos de grande poder de destruição, está transformando as maiores unidades de Saúde do estado em “hospitais de guerra”, devido ao volume de atendimentos desse tipo de ferimento. Esse drama traz consigo um outro: maior poder de destruição das armas (como fuzis e pistolas de calibre restrito, por exemplo) e pouca (ou nenhuma) especialização para conter tamanho número de demandas diárias.
Com base em trabalho de levantamento da Secretaria Estadual de Saúde (SES), apenas no primeiro semestre desse ano, no Hospital Estadual Azevedo Lima (Heal), no Fonseca, Zona Norte de Niterói, deram entrada 132 pacientes baleados, nos mais variados tipos de ocorrência. No Hospital Estadual Alberto Torres (Heat), no bairro Colubandê (São Gonçalo), os números são ainda mais impressionantes, com 272 atendimentos registrados de pacientes baleados na unidade, de janeiro a junho desse ano.
Ao longo dessa triste e dramática escalada, certamente os dois hospitais devem superar suas próprias estatísticas no fim do ano. Em 2016, o Heal registrou o atendimento a 192 pacientes baleados e o Heat mais 404, totalizando nas duas cidades 596 registros. O número de óbitos nesses casos não são fornecidos pela SES, assim como os números relativos ao Hospital Estadual Prefeito João Batista Cáffaro, em Manilha (Itaboraí), considerado de apoio.
“Não estamos preparados para atendimento de guerra. Quando chega um paciente baleado, a equipe de cirurgia e a equipe clínica também é acionada, parando de certa forma o serviço do hospital, seja ele marginal ou cidadão de bem. Prejudica o atendimento normal. Não estamos preparados para trabalharmos em áreas de conflitos de guerra (porque o Rio está vivendo uma guerra). No Hospital Estadual Alberto Torres foi criado o Setor de Trauma, para o qual são encaminhados pacientes baleados trazidos pelo Samu, Corpo de Bombeiros ou por policiais. Há uma equipe a postos, de plantão, mas na sua maioria não são preparados para atendimento de guerra”, explicou o médico Clóvis Cavalcante, presidente do Sindicato dos Médicos de Niterói, São Gonçalo e Região.
No Rio, o mesmo panorama nebuloso se repete, com a totalização das secretarias Estadual e Municipal de Saúde atingindo mais de 4 mil pacientes baleados no ano passado, em 12 unidades hospitalares. O Hospital Municipal Miguel Couto, na Gávea, Zona Sul, o número de pacientes baleados passou de 66 em 2015 para 117 no ano passado. Para outra unidade, o Hospital Municipal Souza Aguiar, no Centro, deram entrada 180 pacientes baleados em 2015 e 300 em 2016.
“O sindicato não tem o que fazer a não ser alertar a polícia e a prefeitura. Esse aumento de demanda aumenta o estresse dos médicos, que não podem fazer milagres. Normalmente quem atende é um cirurgião, um neurocirurgião ou um clínico geral. O que acontece é que o gestor tem que começar a fazer cursos para tratar esses pacientes de guerra civil (porque nós estamos numa guerra civil). A tendência é piorar, porque a criminalidade está aumentando”, concluiu Cavalcante.
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